Em busca de uma sociedade consciente

Antes que a gente morra”, de Ana Larousse, estreia em poesia com foco no instante e na matéria do cotidiano

Antes que a gente morra” apresenta a estreia de Ana Larousse em livro, com um conjunto de poemas que mira o gesto breve, o rumor da memória e as fricções do dia a dia. O título sugere urgência, mas o andamento prefere passos contidos, como quem observa antes de dizer. Assim, a autora organiza cenas que recortam afetos, deslocamentos e restos de conversa, perseguindo imagens que se constroem por aproximação. O resultado é um percurso em que a vida comum, sem ruído de sobras, sustenta a voz lírica.

A edição chega pela Urutau e marca a entrada de Larousse no catálogo de poesia contemporânea brasileira. Embora o livro seja de estreia, a escrita demonstra controle de ritmo e escolha de vocabos, com recuos pontuais que favorecem silêncio e dobra de sentido. Além disso, a curadoria do volume evita excesso de ornamento e deixa que cada poema encontre sua temperatura própria, o que aproxima leitor e experiência sensorial proposta pela autora.

O que podemos esperar?

A construção imagética privilegia o detalhe. Um fragmento de sonho, uma rua atravessada de pressa, o corpo em suspensão no meio de um gesto, tudo se converte em matéria verbal. Em seguida, o verso depura a cena até que reste o essencial. Não se trata de fechar respostas, mas de abrir fendas por onde a leitura possa respirar. Por isso, a sensação é de que os poemas se montam diante do leitor, peça a peça, sem “virar as costas” para as dúvidas do próprio texto.

Há, também, uma atenção à forma que recusa pirotecnia. Quebras controladas, jogos discretos com sonoridade e pausas estratégicas sustentam a leitura. No entanto, quando a imagem exige velocidade, o poema acelera e deixa marcas de passagem, como se o verbo registrasse o risco do mundo sobre a página. Essa alternância mantém o livro móvel, sem ceder ao impacto fácil nem ao enigma vazio.

O horizonte de referências sugere trânsito entre tradições. Ecos de escrita confessional aparecem filtrados por senso de estrutura, enquanto a herança de jogos linguísticos surge como ferramenta, não como fim. Por outro lado, a dicção evita a armadilha de “falar por slogans” e investe em voz que se reconhece no limite do que pode nomear. O efeito é de maturidade de oficina, com espaço para o improviso controlado.

O livro conversa com leitores que buscam poesia de observação e também com quem prefere o ensaio do afeto, sem grandiloquência. Em particular, a autora parece interessada no instante anterior ao acontecimento, quando ainda é possível escolher o tom da resposta. Portanto, o texto não procura resolver dilemas, e sim sustentar a experiência de percebê-los.

Vale a pena?

Do ponto de vista editorial, a obra circula em volume breve, de leitura contínua, que convida a retornos. O formato reforça a ideia de série de quadros, em que um poema comenta o outro por contraste. Em alguns momentos, o gesto de montagem faz lembrar cadernos de nota, mas a lapidação do verso demonstra que não se trata de rascunho. É arquitetura precisa, de aparência despojada.

Para leitores que chegam a Larousse pela primeira vez, o livro funciona como porta de entrada para uma voz que prefere o comum ao espetáculo. Ainda, a escolha de imagens domésticas e deslocamentos urbanos constrói empatia discreta, sem apelo sentimental. A economia verbal, quando combinada com dobras de sentido, produz releituras produtivas e deixa pequenas fagulhas na memória. Então sim, vale a pena.

Ao fim, “Antes que a gente morra” se afirma como estreia consistente, atenta ao modo como palavras e corpo dividem o mesmo espaço. Por fim, o livro se sustenta não por efeito de novidade, mas por trabalho de escuta, ritmo e ética do olhar. É poesia que se aproxima do leitor com calma, pede passagem e, quando termina, permanece um pouco mais no ar.

Adquira o seu aqui: Antes que a gente morra

Compartilhe nas redes sociais

Lorem ipsum dolor sit amet, consectetur adipiscing elit, sed do eiusmod tempor incididunt ut labore et dolore