O Morgan Stanley mudou de forma abrupta sua leitura sobre a dívida argentina. Uma semana depois de recomendar a compra de títulos do país, o banco revisou o cenário e abandonou a indicação, atribuindo a guinada à derrota do governo Javier Milei na Província de Buenos Aires. A avaliação é que o resultado eleitoral aumenta a incerteza sobre a capacidade do Executivo de aprovar reformas e sustentar o programa de estabilização.
O peso da derrota é político e aritmético. Buenos Aires concentra perto de 40 por cento do eleitorado e a diferença foi de 13 pontos para a oposição peronista. Para investidores, o recado é que construir maioria para mudanças profundas ficará mais difícil, o que encarece o custo de financiamento do governo e reduz a probabilidade de avanços rápidos em marcos regulatórios e privatizações.
Argentina’s financial markets tumble amid government corruption allegations | Reuters
A reação do mercado foi imediata. O índice Merval caiu na casa de dois dígitos e a moeda recuou entre 4 e 5 por cento no primeiro pregão após o resultado. Títulos em dólar perderam de 6 a 9 por cento, refletindo prêmio de risco maior e dúvidas sobre a trajetória fiscal e cambial. O quadro adiciona pressão sobre o Banco Central da Argentina e sobre metas pactuadas com o Fundo Monetário Internacional.
Outras casas reforçaram o tom de cautela. Relatos apontam que o J. P. Morgan vê o peso vulnerável a novas desvalorizações e que o BTG Pactual destaca estagnação da atividade desde abril. Em relatório, analistas criticam mudanças sucessivas no arcabouço monetário e a tendência de atribuir os problemas apenas ao risco político, em vez de reconhecer falhas de concepção do programa.
No plano econômico, a combinação de inflação ainda alta com contração da renda testará a paciência social nos próximos meses. A experiência regional sugere que estabilizações bem-sucedidas preservam amortecedores mínimos, calibram comunicação e oferecem previsibilidade regulatória. Sem esses elementos, o custo de ajuste recai de forma desproporcional sobre famílias de baixa renda e pequenas empresas, o que amplia resistência política.
Para o governo Milei, a encruzilhada é clara. Manter o norte da consolidação fiscal e, ao mesmo tempo, recompor pontes com governadores e Congresso para destravar votações. Para investidores, os sinais a acompanhar incluem disciplina no câmbio e juros, estratégia para reservas, calendário legislativo factível e diálogo com o FMI que converta intenção em entregas verificáveis. Até lá, recomendações mais defensivas tendem a prevalecer.
Fontes:
Imagem da capa: La relación entre Milei y Villarruel, sin retorno.Reuters
Jonathan de Jesus, o Diálogo, Brasil.